Dra Fernanda Papaterra Especialista em gagueira em São Paulo

Fonoaudióloga

CRFa.2-1929

Currículo :

– Fonoaudióloga pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

– Pós-Graduação e Especialização em Afasia e Gagueira pela University of North Dakota, U.S.A.

– Autora dos Manuais Papaterra, livros de exercícios para treinamento da atenção, memória, raciocínio lógico, habilidades de compreensão, expressão, criatividade, etc.

– Diplomada em Logotherapy pelo Victor Frankl Institute of Logotherapy.

– Apresentou inúmeros trabalhos em Congressos no Brasil e no exterior.

– Fundadora da Associação Ser em Cena – Teatro de Afásicos, que visa a reabilitação de portadores de lesões cerebrais através da arte dramática.

– Atende portadores de Distúrbios da Comunicação em seu consultório desde 1975.

Fono

Endereço : Avenida São Gabriel, 201 – Conjunto 1206

Bairro : Itaim Bibi – São Paulo – SP

Telefone : (11) 3704-6242

Gagueira: quando as palavras não fluem

Vivemos em um mundo dominado pela palavra falada. Para a maior parte das pessoas, falar não constitui problema algum. Elas simplesmente abrem a boca e – sem pensar no complexo mecanismo envolvido neste ato – ouvem suas palavras fluindo como água cristalina descendo a montanha. Falar é fácil, fazer é que são elas, diz o conhecido ditado popular. Só que para algumas pessoas, falar não é fácil.

Se você gagueja, está em boa companhia. Através da Historia, sabe-se de pessoas famosas que gaguejavam. Entre estas podemos citar Moisés, Aristóteles, Isaac Newton, Charles Darwin, Lewis Carroll, Winston Churchill, Marylyn Monroe e muitos outros.

A gagueira é um problema pessoal: indivíduos que gaguejam relatam medo, frustrações, insatisfações, baixo nível de aspiração e perda de autoestima. A gagueira é um fenômeno psicossocial. Raramente uma pessoa gagueja quando sozinha.

Se você gagueja, sabe que a experiência de gaguejar é muito mais do que simples bloqueios ou repetições de fonemas ou silabas. Pode afetar sua vida como um todo. Esta experiência inclui um constante medo de situações de fala, o medo do ridículo e a rejeição. Se você gagueja, conhece muito bem a incerteza de não saber se as palavras fluirão quando mais se precisa delas. E provavelmente já experimentou também:

– A sensação de sentir-se abandonado pela fala numa situação crucial.

– A frustração de não ser capaz de dizer o que deseja, no momento em que precisa.

– A ansiedade só de pensar que pode ser chamado para falar em público.

– O vexame de não conseguir dizer o próprio nome ao se apresentar.

– O medo que o leva a fugir de situações de comunicação que gostaria de enfrentar.

– A humilhação de ser caçoado por pessoas cruéis.

– A desilusão de ver outra pessoa menos capaz ocupando sua vaga de trabalho, só por ser mais fluente.

– A resignação de renunciar a uma profissão que gosta só porque esta envolve comunicação.

– A indignação de ser constantemente “ajudado” a terminar as palavras.

– A raiva por ter que andar cinco quarteirões até o supermercado por não ter coragem de pedir o pão na padaria.

Se você gagueja, saiba que a gagueira tem tratamento. Procure um fonoaudiólogo especializado nesta patologia.

Fernanda Papaterra Limongi – Fonoaudióloga – São Paulo – SP

Médica

Entrevista-  Gagueira – Fernanda Papaterra Limongi

 

A gagueira ocorre quando o fluxo da fala normal é interrompido anormalmente por repetições, prolongamentos ou bloqueios, ou por comportamento de evitação ou luta.A gagueira é conhecida há muitos séculos: Moisés é citado como a primeira pessoa com gagueira que se tem notícia. “Perdoa, Senhor; não sou de palavra fácil: minha língua é tarda” (Êxodo, 4:10). Embora seja um problema antigo e universal, presente na humanidade através de toda a História, até hoje suas causas não são totalmente conhecidas. Por que? Simplesmente porque não existe uma só causa que explique todos os casos de gagueira. E talvez, esta seja a única premissa em que todos os teóricos que se propõem a estudar a gagueira concordam: que não existe uma só causa para o aparecimento desta condição.

 

Drauzio – Todos nós gaguejamos em certas situações, quando não conseguimos explicar direito alguma coisa ou estamos num ambiente adverso. Quando a gagueira deixa de ser um fenômeno aceitável?
Fernanda Papaterra – Vamos começar pelo diagnóstico diferencial. A gagueira pode ser uma reação episódica ao estresse. A pessoa gagueja porque está sob tensão, falando em público ou enfrentando uma situação de perigo, por exemplo. Seu corpo está envolvido na ação como um todo: ela transpira, treme, tem taquicardia. Não é um simples problema de fala. A diferença crucial é que esse tipo de gagueira decresce ou cessa, à medida que o estresse vai desaparecendo.
Gagueira é problema quando a fala é interrompida por lutas, hesitações e bloqueios em todas as situações de comunicação, inclusive na leitura. Gaguejar diante do chefe ao apresentar uma desculpa pelo atraso, é muito diferente de fazê-lo na rotina da sala de aula ou ao pedir pão na padaria.

Drauzio – Crianças pequenas gaguejam com frequência. Quando a gagueira das crianças deve ser motivo de preocupação para os pais?
Fernanda Papaterra – 
É muito difícil uma pessoa começar a gaguejar aos 15 anos ou na idade adulta. Normalmente, a gagueira funcional é uma desordem da primeira infância. Com dois ou três anos as crianças podem apresentar uma disfluência porque não dominam o vocabulário necessário para dizer tudo o que querem, estão ansiosas ou brigando pela atenção dos pais. A gagueira deve ser motivo de preocupação para os pais quando a criança está consciente da dificuldade e luta para falar. Nesse caso, se o problema persistir por mais de seis meses, eles devem procurar ajuda especializada.

Drauzio – Existe uma idade limite para determinar essa diferença?
Fernanda Papaterra – Idade, não. O determinante é a luta e a consciência. Já vi crianças de três anos tensas, batendo a cabeça na parede ou o pezinho no chão porque não conseguiam falar, e crianças com sete anos um pouco disfluentes, mas sem consciência do problema nem lutando para falar. Essas podem esperar mais tempo e o problema pode desaparecer sozinho.

Drauzio – Sempre houve gagos na história da humanidade?
Fernanda Papaterra – 
Sempre. Segundo a Bíblia, Moisés era gago. Há um trecho em que ele diz – “Minha língua é tarda”. Demóstenes, orador grego, mestre da eloquência, colocava pedrinhas na boca e discursava à beira-mar para superar o problema e fazer a voz sobressair apesar do barulho das ondas.
Apesar de casos de gagueira fazerem parte da história da humanidade, o problema varia em função da cultura do povo e da importância que dá à comunicação. Há muitas curiosidades a respeito do assunto. Há pessoas que gaguejam lendo, há as que gaguejam só diante de estranhos e as que só gaguejam diante de determinadas pessoas. Quando fazia estágio nos Estados Unidos, conheci um gago que trabalhava como Papai Noel e era perfeitamente fluente quando vestia as roupas de trabalho.

Drauzio – Dizem que Nélson Gonçalves, um grande cantor brasileiro, era gago. Por que as pessoas não gaguejam quando cantam?
Fernanda Papaterra – Por alguns motivos. Primeiro, por causa do ritmo. Qualquer pessoa que acompanhe um ritmo, mesmo o gago mais gago, fala com fluência. Basta bater cadenciado numa mesa, seguir o compasso do metrônomo ou falar destacando as sílabas des-temo-doas-sim.
Tem gente que “trata” (veja que está entre aspas) gagueira colocando um metrônomo ou pedindo para a pessoa falar num determinado ritmo. Nessas condições, ela não gagueja porque tal mecanismo funciona como distração e como marcador. Saindo dali, o problema reaparece.
Pesquisas norte-americanas mostraram que a gagueira desaparecia nos soldados que foram para a guerra do Vietnã, que funcionava como mecanismo de distração. Eles estavam muito mais preocupados com a sobrevivência do que com a comunicação oral.

Drauzio – Quais as causas da gagueira?
Fernanda Papaterra–
Não existem causas que expliquem todos os casos. Por isso o assunto é tão polêmico. Acredito que para uma pessoa desenvolver gagueira são necessários três fatores, os três “P”: o fator predisponente (a pessoa tem uma predisposição genética, congênita), o fator precipitante que é sempre de origem ambiental e o fator perpetuanteque mantém o problema.Quanto ao fator predisponente não se pode fazer nada e o precipitante já aconteceu. Atuamos no perpetuante. Há um círculo vicioso onde o gago tenta falar, não consegue, tensiona os articuladores, luta, fica com medo, inseguro. Quanto mais medo, mais insegurança, mais ele luta e o problema acaba se perpetuando.

Drauzio – Interessante esse círculo vicioso ao qual você se referiu. Pessoas com dificuldade de fala evitam situações que as obrigue a falar na frente dos outros. Ora, como falar em público implica aprendizado e treino, a tendência é só agravar o problema.
Fernanda Papaterra – 
Por isso, digo que a gagueira é um problema pessoal e um problema social também, porque a reação do ouvinte é muito importante. O gago espera causar boa impressão; espera que o ouvinte o entenda, elogie e aprove. As pessoas não gaguejam quando estão sozinhas em casa. Experimentos mostram que, lendo no quarto, sem ninguém por perto, o gago é fluente. Se notar, porém, que alguém se aproximou, começará a gaguejar. Se não perceber, continuará fluente.

Drauzio – Por isso, quem está de fora conclui que o problema é eminentemente psicológico, porque sozinho o gago consegue ser fluente.
Fernanda Papaterra – Nenhum gago gagueja falando com o próprio cachorro ou com um bebezinho, porque a exigência da comunicação desaparece. Sem cobrança, ele consegue falar bem. Isso pode reforçar a ideia de que a gagueira é um fenômeno só psicológico. No entanto, há outros fatores envolvidos.
Vamos voltar ao círculo vicioso. A expectativa de ter que falar gera tensão, que é um componente físico, e a musculatura não obedece. É como se a palavra ficasse presa. Já vi momentos de gagueira que se estenderam por quase um minuto.
Por que falando com o cachorro, com o bebê ou sozinha no quarto isso não acontece? Porque não havendo necessidade de preparar a fala, não existe ansiedade nem tensão.

Drauzio – Existem palavras e letras temidas pelos gagos?
Fernanda Papaterra – A palavra problema é uma delas. O /p/ é um fonema plosivo que por si só oferece dificuldade. Além disso, existem dois grupos consonantais – /pr/ e /bl/ – que são difíceis de ser articulados. Na escola, responder “presente” na hora da chamada é outra palavra temida por causa do /p/ e do grupo consonantal /pr/ no início da palavra. A criança treina em casa, ensaia, mas nada disso adianta quando a professora chama seu nome na sala de aula. A antecipação do problema gera tensão. O gago geralmente sabe que vai bloquear em determinada palavra, mesmo antes de dizê-la.  Essa dificuldade explica por que é comum o gago bater na mesa, piscar o olho, entortar o corpo ou chutar a mesa quando precisa falar. Ele acha que, agindo assim, ajuda a articular a palavra.

Drauzio – Não é incomum pessoas gagas serem motivo de chacota. Especialmente as crianças pequenas podem ser muito cruéis nessa fase. Qual é o impacto dessa atitude em quem tem dificuldade para falar?
Fernanda Papaterra – Sem dúvida, a reação do ouvinte pode ser uma agravante e provocar o desenvolvimento de mecanismos associados para evitar a chacota.
A pessoa pode fugir das situações de exposição, como faltar no dia da chamada oral. É uma pena que seja assim: ninguém ri de um pé quebrado; porque riem de uma quebra de fluência? Gagueira não tem graça!!! Tem tratamento!

Drauzio – Como costumam evoluir os casos de gagueira se não forem tratados?
Fernanda Papaterra 
– Até a década de 1960, não se tratava gagueira no Brasil. Como a gagueira é uma desordem que se manifesta normalmente na primeira infância, alguns indivíduos acabavam criando mecanismos que os ajudavam a vencer a dificuldade ou permaneciam gagos pela vida toda. Às vezes, eram obrigados a optar por profissões que não dependessem da fala como instrumento de trabalho. Soube de uma professora que selecionava as palavras usadas em sala de aula para evitar os fonemas temidos.

Drauzio – Em que consiste o tratamento de uma criança gaga?

Fernanda Papaterra– Primeiro, é preciso verificar se a criança está consciente da dificuldade e consegue entender o que está ocorrendo. Com crianças em idade escolar, a partir dos sete anos, jogo aberto e uso a palavra gagueira. Antigamente, não era essa a conduta recomendada. Empregavam-se eufemismos – um probleminha defala, porque acreditavam que dar nome ao fato piorava o quadro.
Uma vez recebi uma criança que já havia feito terapia por bom tempo com uma pessoa que não mencionava a palavra gagueira. Quando lhe falei como chamava o distúrbio que apresentava, ela observou aliviada: “Que bom! Enfim alguém descobriu o que eu tenho”.

Drauzio – Que técnicas são usadas para corrigir esse problema?
Fernanda Papaterra– Diferentes fonoaudiólogos – que é o profissional indicado para tratar gagueira – utilizam diferentes abordagens. Eu utilizo a modificação do comportamento. Se a criança tem mais de sete anos, filmo-a enquanto fala e depois peço que aponte o que vê de errado em sua comunicação. Às vezes, gagueja muito; às vezes, repete palavras, tensiona o olho, pisca ou entorta a boca sem tomar consciência do que está fazendo.
Definimos os momentos de gagueira como bloqueios (as palavras nãosaem), repetição (pa-pa-pa papagaio) e prolongamento (e…e…e…então) e quantificá-los ajuda a perceber a gravidade do distúrbio. “Em um minuto você gaguejou cinco vezes, ou duas, ou três.”
Existem pessoas que durante a consultanão gaguejam porque aliviam a tensão só de falar no assunto e saber que não precisam esconder a gagueira.

Drauzio Como evolui o tratamento?
Fernanda Papaterra – Acredito que a gagueira seja um evento que pode ser desativado pela modificação do comportamento. Até as crianças entendem a analogia com um vidro de geleia difícil de abrir. A gente força, força, e só desiste quando atingiu o objetivo: girar a tampa e abrir o vidro. O mesmo acontece com a pessoa que quer falar “pato”, por exemplo. Ela força até a palavra sair, mas gagueja e vai ser assim enquanto não aprender que não pode lutar. Essa é a primeira etapa do tratamento: o cancelamento da luta. Diante da palavra temida, percebendo que vai lutar, a pessoa deve parar, desmanchar a postura articulatória, relaxar e tentar pronunciá-la com contato suave. Às vezes, no começo, não consegue fazê-lo numa situação de estresse ou pressa, mas repetindo a técnica, automatiza o comportamento e torna-se fluente.

DrauzioQuer dizer que as pessoas podem não perceber suas dificuldades ao falar?
Fernanda Papaterra– A pessoa fala automaticamente e pode não perceber, por exemplo, que repetiu inúmeras vezes a mesma palavra. Por isso, o primeiro passo é ajudá-la a identificar o problema. O interessante é que, se lhe perguntarmos quantas vezes gaguejou ao ler um texto, acha que foram cinco. Quando vê o filme, descobre que foram cinquenta.
O processo de identificação é seguido pelo de cancelamento da luta: a pessoa tem que aprender a não lutar. O terceiro passo é aprender a falar com contato suave. A instrução é: –“Você está falando, percebeu que vai lutar, pare e relaxe a musculatura, como o faz quando cai a linha numa ligação telefônica ou alguma coisa lhe distraiu a atenção.

DrauzioE o passo seguinte, qual é?
Fernanda Papaterra – O próximo passo é a fluência. A pessoa precisa aprender a ser fluente primeiro na leitura, depois no monólogo e, por fim, na conversação. Ela precisa aprender a falar sem luta, com contato suave e a abandonar os mecanismos adquiridos por causa da gagueira.

Drauzio Como são tratadas as crianças muito pequenas?
Fernanda Papaterra – Se a criança é muito pequena, trabalho com os pais que são orientados para não a conscientizarem da luta ao falar. Em geral, a maioria não sabe como agir, se falam a palavra gaguejada ou ignoram o fato. O melhor é não chamar atenção para o problema. Os pais devem dar tempo para a criança expressar-se e jamais terminar por ela a palavra gaguejada. Mas também não devem fazer uma conspiração de silêncio que a criança percebe.

Drauzio – Imagino que haja diferentes graus de gagueira. Há pessoas ligeiramente gagas e outras muito gagas. Em média, quanto dura o tratamento?
Fernanda Papaterra – Em média, o tratamento dura um ano. Esse é o tempo que se leva para estabelecer a fluência primeiro diante do terapeuta que conhece a dificuldade, o que deixa a pessoa mais à vontade. Depois, vem a fase de transferência para outras situações e de manutenção.
Drauzio Os resultados são gratificantes?
Fernanda Papaterra – Sim, na maior parte dos casos. Mais fluentes e felizes, as pessoas mudam de vida, porque a comunicação é fundamental. Alguns casos são mais difíceis pois podem existir outros fatores associados. A colaboração do paciente também é fundamental.